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Governo do Paraná comemora parque criticado em Guaratuba

“Paraná festeja criação do Parque Guaricana, na Serra do Mar” é o título da reportagem da Agência de Notícias do Paraná com o governador Beto Richa.

“O Governo do Paraná exerceu papel decisivo e agora podemos comemorar a criação dessa unidade de conservação”, disse Richa.

O que o governador não sabe e o Ministério do Meio Ambiente nunca procurou saber é que as comunidades afetadas são contra o parque nacional, mas têm propostas alternativas para preservar a extensa área situada praticamente toda em Guaratuba.

“Removemos todos os obstáculos para que o governo federal finalmente decretasse sua criação e em reunião em Brasília na semana passada obtivemos a confirmação da área”, alegra-se o secretário estadual do Meio Ambiente, Antonio Caetano de Paula Jr.

Contrariando os fatos, o secretário ainda afirma que o “processo de criação do Parque Nacional Guaricana começou há cinco anos, com a participação de toda a sociedade, prefeituras e entidades ambientalistas”.

A agência oficial também informa que “a área do parque é repleta de Araucárias e fica entre as rodovias BRs 277 e 376, nos municípios de São José dos Pinhais, Morretes e Guaratuba” e o secretário “destaca que o parque tem grande potencial de visitação, pois fica a 50 quilômetros de Curitiba”.

Os fatos

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão do Ministério do Meio Ambiente, estuda desde 2008 a criação da Unidade de Conservação de 40 mil hectares no entorno da Fazenda Guaricana, de 7.900 hectares, que pertenceu ao extinto banco Bamerindus e passou para a União com a liquidação do banco. Guaricana é o nome de uma palmeira: Geonoma schottiana Mart.

A unidade será o segundo parque nacional na Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaratuba que tem 199.569 hectares entre os municípios de Guaratuba (65,61%), São José dos Pinhais (11,25%), Tijucas do Sul (9,24%), Morretes (6,43%), Paranaguá (5,69%) e Matinhos (1,78%). A APA ocupa mais de 90% do território de 135,8 mil hectares Guaratuba. O Parque nacional Saint-Hilaire/Lange, desde 2001, ocupa 25.190 hectares da APA.

Comunidade protesta e impede audiência pública

Dos 40.156,15 hectares do Parque da Guaricana também mais de 90% ficam em Guaratuba. Por isto, foi na cidade em que o ICMBio tentou realizar as obrigatórias audiências públicas. Esbarrou na oposição da comunidade e acabou usando uma manobra para cumprir, de forma questionável, a exigência legal.

No dia 9 de dezembro de 2009, a audiência pública marcada para acontecer no salão da Igreja Matriz, mobilizou a comunidade rural. Caminhões e ônibus percorreram distâncias de até 80 quilômetros para protestar.

Eles traziam um abaixo-assinado com mais de 900 assinaturas de moradores das localidades de Caovi, Pai Paulo, Rio do Melo, Vitório, Cubatão, Rasgado, Rasgadinho, Ribeirão Grande e Limeira pedindo o cancelamento da audiência. No documento, eles reclamavam que o ICMBio não cumpriu requisitos legais para a criação de parques, como um estudo socioeconômico detalhado e o diálogo com as comunidades afetadas.

Foi outro documento que eles entregaram aos técnicos: uma ordem da juíza Priscilla Shoji Wagner para suspender a reunião. A juíza também determinou que o Ministério do Meio Ambiente entregasse ao Ministério Público e ao Departamento do Meio Ambiente de Guaratuba o projeto detalhado da unidade de conservação no prazo de 15 dias.

Acuados, os técnicos ignoraram a ordem judicial e não tentaram dialogar. Em resposta ao Correio do Litoral, o ICMBio afirmou, em janeiro de 2010, que a decisão liminar concedida a pedido do promotor Rui Riquelme de Macedo, do Ministério Público Estadual não tinha validade: “Nossa vinculação administrativa é com o Ministério Público Federal”, afirmou a assessoria do órgão, que acrescentou a ameaça: “Não é necessário a aprovação das populações locais na criação de Unidades de Conservação”.

O que eles não quiseram saber

A falta de diálogo com as comunidades é reconhecida no próprio Relatório Fundiário do ICMBio, que informa no segundo parágrafo: “É importante destacar que, face o tempo reduzido entre a contratação dos trabalhos e o prazo para entrega dos relatórios, adaptações tiveram de ser realizadas na metodologia. A fase de entrevista individual com moradores e proprietários teve de ser suprimida e em seu lugar se decidiu pela realização de incursão preliminar a campo”.

Se os técnicos tivessem gasto mais tempo conversando com as comunidades envolvidas e buscando um acordo após a audiência frustrada, saberiam que eles não são contra a preservação da extensa área. O que eles temem é a chamada “Zona de Amortecimento” do futuro parque, uma extensão de 10 quilômetros dos limites da UC que terá de obedecer critérios ambientais específicos que só serão definidos no Plano de Manejo.

Os 10 quilômetros alcançam grande parte das propriedades rurais e comunidades rurais. Alcançaria áreas que colocam Guaratuba como principal produtor agrícola do Litoral do Paraná e entre os maiores produtores de banana do Brasil. Elas ficam dentro da APA de Guaratuba e são regidas por seu Plano de Manejo, que prevê 32 áreas com seis tipos de restrições e limites de exploração econômica.

Propostas da comunidade

Diante do que parece inevitável, a comunidade rural apresenta duas alternativas ao Parque. A primeira é a criação de uma Área de Proteção Ambiental Especial, que tem restrições de uso mais rigorosas que um parque, mas apenas nos limites da fazenda Guaricana e outras áreas pertencentes à União dentro da APA.

A segunda é a adoção dos critérios do Plano de Manejo da APA de Guaratuba para a Zona de Amortecimento do parque nacional. Questionado pelo Correio do Litoral, também em janeiro de 2011, o ICMBio admitiu estudar a segunda hipótese. Mas não se deu ao trabalho de responder à comunidade.

De lá para cá, fez-se silêncio no ICMBio e em 2011 as comunidades que haviam se mobilizado foram surpreendidos com a realização de uma “audiência pública” que teria sido feita em apenas com uma pequena comunidade do alto da serra. A notícia surgiu e sumiu do site do ICMBio.

O silêncio foi rompido nesta quinta-feira (5) com a comemoração barulhenta do governo estadual em nome de todo o Paraná.

Abaixo a imagem divulgada pelo Governo do Paraná que mostra a ferrovia projetada cortando o parque.

 

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