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Juiz acusado de desvio de indenizações de pescadores

Foto: Agência Brasil
Foto: Agência Brasil

Um juiz, um cartorário e um diretor de Colônia de pescador estão entre as pessoas presas na Operação Tarrafa, realizada nesta terça-feira (5) no Litoral, Curitiba e Ponta Grossa.

A operação foi desencadeada pela 1ª Promotoria de Justiça de Paranaguá, com o apoio do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado).

Os presos são acusados de desvios de indenizações destinadas a pescadores do Litoral do Paraná por causa dos acidentes ambientais da Petrobras em 2001.

Até o início desta tarde, foram cumpridos oito mandados de prisão e nove mandados de busca e apreensão em empresas e residências situadas em Paranaguá, Curitiba, Antonina, Guarapuava e Ponta Grossa. Também foram executadas 13 conduções coercitivas (pessoas levadas para prestar depoimento, mas que não estão detidas).

Entre o material apreendido durante a operação estão documentos, computadores e telefones celulares. Com três presos ainda foram encontradas armas de fogo, com as autorizações de porte vencidas.

A investigação, conduzida pela 1ª Promotoria de Paranaguá, foi iniciada em maio deste ano. Ela apura a existência dos crimes de apropriação indébita de valores de pescadores, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, envolvendo contadores, advogados, administradores de empresa, funcionários públicos e um diretor de associação de pescadores. (Com informações do Ministério Público Estadual)

 

O esquema segundo o Ministério Público – fonte: Gazeta do Povo

Os jornalistas da Gazeta do Povo Oswaldo Eustáquio, Felippe Aníbal e Mauri Konig dão os nomes e os detalhes da suposta fraude. Leia:

Foram presos preventivamente o juiz aposentado Hélio Tsutomu Arabori, o escrivão Ciro Antônio Taques, o advogado Marcos Gustavo Anderson. Com a prisão preventiva decretada, o serventuário da Justiça Arival Tramontin Ferreira Junior está foragido.

Os quatro seriam os cabeças do esquema, liderado por Taques. Outras 12 pessoas acusadas de participar do esquema tiveram prisão temporária decretada ontem. Cinco delas foram detidas e sete estão foragidas. Ao grupo são imputados crimes de quadrilha, apropriação indébita, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Acusada de integrar o grupo, a advogada Cristiane Uliana não está entre as pessoas que tiveram a prisão decretada ontem porque ajudou nas investigações. Ela descreveu o esquema ao MP logo depois de a reportagem da Gazeta do Povo revelar que ela teria se apropriado indevidamente do valor das indenizações de 18 pescadores. Segundo as investigações, ela teria sido convidada a integrar o grupo em novembro de 2004, nas ações contra a empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda no acidente do navio Vicuña. Em 2005, passou a responder também por parte das ações contra a Petrobras.

O esquema

De acordo com as investigações, o esquema teria sido criado inicialmente para que o núcleo arrecadasse dinheiro a partir do recebimento de custas processuais das ações ingressadas pelos pescadores contra a Petrobras. Os cabeças do grupo teriam cooptado advogados, que visitavam ilhas do litoral e recolhiam assinaturas em procurações de pescadores, estimulando-os a ingressar com ações de indenização. O presidente da Federação de Pescadores do Paraná, Edmir Manoel Ferreira, também teria aderido à quadrilha e convencido outros pescadores a entrar com pedidos de indenização. Ele é um dos suspeitos presos temporariamente.

Segundo a 1.ª Promotoria de Justiça Criminal de Paranaguá, três empresas teriam sido criadas para operacionalizar “as vantagens indevidas” e para lavar o dinheiro, obtido a partir do esquema. Por meio delas os valores seriam repassados ao núcleo central. Segundo as investigações, caberia a Cristiane fazer os cálculos da partilha dos valores auferidos com as custas processuais. Taques, o escrivão acusado de ser o líder do grupo, ficava com 32% da arrecadação. Arival, conhecido pelo sobrenome Junior, ficaria com outros 32%. Cristiane e o juiz Hélio Arabori ficariam com 18% cada um.

As investigações contam com interceptações telefônicas e de e-mail, com a quebra do sigilo bancário – todos autorizados pela Justiça – e com uma série de depoimentos dos investigados.

A Gazeta do Povo tentou manter contato com os acusados presos ontem, mas não conseguiu falar com todos. O jornal está aberto a ouvi-los, ou a seus representantes, para dar sua versão sobre as acusações.

Esquema teria iniciado em 2003

Dois acidentes ambientais provocados pela Petrobras, em 2001, e outro envolvendo o navio chileno Vicuña, em 2004, teriam desencadeado as fraudes investigadas na 1.ª Vara Cível de Paranaguá. Para o Ministério Público, o esquema começou em 2003. As investigações traçam uma cronologia dos acontecimentos.

Entre 2003 e 2004, o escrivão Ciro Antônio Taques teria mandado o advogado Maximilian Zerek e Arival Tramontin Ferreira Junior (funcionário da Vara Cível e seu cunhado à época) percorressem o litoral do Paraná para colher assinaturas em procurações e contratos advocatícios para viabilizar ações de indenização a pescadores afetados pelos acidentes. Taques teria pago de R$ 8 a R$ 9 para cada procuração assinada.

A intenção de Taques seria receber valores decorrentes das custas processuais decorrentes das ações propostas contra a Petrobras, em relação ao vazamento de óleo do Poliduto Olapa. Haveria um acerto com o chefe do Cartório Distribuidor para o direcionamento dessas ações de indenização à 1.ª Vara Cível. A remuneração daqueles que participavam do esquema montado pelo escrivão seria paga com o dinheiro das custas processuais. Após a assinatura de procurações e honorários contratuais, de janeiro a setembro de 2004 foram ajuizadas milhares de ações em relação ao Poliduto Olapa e ao Navio Norma.

Pelas investigações, os processos teriam ficado parados no Cartório da 1.ª Vara Cível até o acidente com o Navio Vicuña, em 2004, quando foi colocado a “mão na massa”. Para esse caso teria sido montada a mesma estrutura, com a participação do presidente da Colônia de Pescadores, Edmir Manoel Ferreira, e do advogado Maximilian Zerek para a captação de pescadores. Assim, teriam sido obtidas em um primeiro momento 2.340 procurações em relação ao acidente do Vicuña.

Em dezembro de 2004, Maximilian teria saído do esquema por não receber de Taques os valores combinados. As ações foram substabelecidas para outro advogado. Cristiane Uliana teria sido convidada a integrar o grupo nas ações contra a empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda, sobre o acidente do Vicuña. No ano seguinte ela assumiu parte das ações contra a Petrobras.

Em 2005, o juiz Hélio Arabori teria pressionado para entrar na partilha do dinheiro. Teria cabido a Cristiane fazer os cálculos sobre a participação de cada um no porcentual sobre os 30% dos honorários contratuais acordados com os pescadores nas ações contra a Petrobras. Os valores só passaram a ser recebidos em agosto de 2008, quando foi expedido o primeiro alvará de levantamento nas ações de indenização contra a Petrobras.

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