Crônica da Festa do Divino: “Entrevero forte!!!!”
Todos os anos me organizo, ou pelo menos tento, para comparecer pelo menos uma vez à Festa do Divino – tenho um carinho muito especial por essa comemoração, que pra mim vai além do seu caráter religioso, como uma celebração da cidade, além das praias e do sol do verão, que remonta às quermesses da infância, apesar das modernidades inevitavelmente incorporadas.E como não poderia deixar de ser, além daquela batida de perna básica pelas barraquinhas e stands, cada vez mais variados, uma janta no capricho, a cada ano um sabor novo, procuro alternar um pouco além do tradicional peixe e camarão disponíveis em outras épocas – mas quase sempre acabo caindo no fatídico entrevero, que eu considero uma espécie de preciosidade gastronômica – outros definem como aberração gourmet, mas tudo bem!
E não me canso de fazer propaganda dessa mistura bombástica de carnes, temperos e movimentos, sabores e cheiros que só conheci depois que cheguei a Guaratuba, vários anos atrás. Ei, não se espantem, em São Paulo não tem disso – e em Maringá também não tinha, se tem agora não sei!
Pois foi nesta noite de grande Lua, neste sábado, após a acachapante final do jogo da selecinha brasileira esmagada por “Netherland” e seus comparsas, que optamos pelo consolo aquecedor do entrevero, eu e meus queridos amigos, como forma de distrair ou desmanchar o nó que insistia em arrochar o estômago. Após circular com dificuldades pela multidão, escolhemos um canto aparentemente mais propício, ali onde o fluxo se espalha em rumos distintos – um tanto de gentes vai pra feirinha “paraguaia”, outro tanto pra casa, pela saída secundária que evita o tumulto e um restinho de gente se acomoda para encarar, mais tranquilamente, um sanduíche, um crepe ou um inusitado “yakisoba do divino”.
Na mesa livre, ops, um recado pregado – só poderia ser utilizada por clientes da D’Brunus – de jeito, porque a tal lanchonete dispunha além de um afrontoso pernil assado sendo desfiado, a montanha de pedaços de carnes variadas recoberta por cheiro verde, tomates e cebolas que era, enfim, a minha meta. O garçom, solícito a princípio, “podem se acomodar, eu sirvo vocês, o entrevero é R$15, tem frango, porco, linguiça, carne de vaca, uma delícia, vou anotar seu pedido”.
Vamos lá. Pedimos dois, porque estávamos em 4 pessoas e umas fomes médias, com uma porção de batatinhas e as bebidas: 2 refrigerantes em lata e 1 suco de uva.
Em poucos minutos, bebidas na mesa, latas geladas e conteúdo assustadoramente morno. Mas fazer o que, muito movimento, deve ser isso, quem mandou virmos no sábado à noite.
Em poucos minutos seguintes, os dois pratos de entrevero – o pão de leite, enorme, partido ao meio, despejando incontáveis pedaços de carne derramando-se para além dos seus limites frágeis. Confesso que de cara achei a preparação muito rápida, e com pouco tempero, as carnes estavam assim meio branquelas, até comentei que gostava mais passadinhas, mais crocantes e tostadas, e mais misturadas com as ervas verdes, cebolas, nenhum pimentão, nada de que me lembrava…
Bem diz o ditado: a pressa é inimiga da refeição! E o garçom, já distraído com outros fregueses, sequer nos atendeu quando solicitamos mais dois garfos, que aquilo não dá pra comer com a mão e só vieram dois talheres. Resolvemos tocar a coisa assim mesmo, aguardando as batatinhas.
Porém, na segunda ou terceira mordida, minha amiga saltou da cadeira, e com gestos prementes em busca de um guardanapo, tirou da boca um pedaço de carne absolutamente podre!
Ao colocar sobre a mesa aquele bocado de carne de porco, partido pela sua mordida, o cheiro que aquilo exalava, horrível, implantou-se por toda a mesa, causando engulho a todos! Era inacreditável e nos impediu de continuar comendo. Chamamos imediatamente o garçom que, lógico, não veio até a mesa. Meu amigo foi ao balcão da barraca, reclamando atenção ao problema, e nervoso pela displicência e por não ser ouvido, saiu pra longe, que ele tem o estopim meio curto e não queria criar celeuma.
Após uns 10 minutos, vieram as batatinhas, e o garçom finalmente deu atenção à nossa queixa, quando o presenteamos com o fatídico embrulhinho de papel contendo aquele horroroso naco esbranquiçado de podridão! Retornou, então, com a solução: “a proprietária vai fazer outros lanches para vocês.” Imagine se queríamos? Dispensamos tudo, ficamos só com as batatinhas, fininhas sim, mas inocentes na confusão e aparentemente sadias.
Pedimos a conta, e aí a coisa ficou mais interessante: as fritas e as bebidas – R$ 38,00. Dei duas notas de 20 para o rapaz, com as sobrancelhas franzidas, aquilo não me soou bem. Ele trouxe o troco de R$ 2,00. Não me contive, que não sou boa nisso. Fui até o balcão e perguntei para a moça do caixa o preço da porção de batatas fritas; a resposta foi R$ 15,00, o refrigerante R$ 4,00 e o suco R$ 3,00. Ok, então a conta está errada, a não ser que estivessem nos cobrando os lanches que não comemos. Saímos em busca do “nosso” garçom, atarantado, e questionamos o que foi cobrado.
A resposta dele foi surpreendente: R$ 18,00 pelas batatas, R$ 4,50 pelos refris e R$ 4,00 do suco, “porque tem os 10%.” A conta dos “dez por cento” causou-me espécie.
Rindo, comentei com ele sobre os preços anunciados no caixa da barraca – ele “refez” a conta e concluiu que realmente estava incorreta, pediu que aguardássemos, o que fizemos com tranquilidade, e voltou então com o “troco certo” – R$ 6,00.
Tenha a santa paciência – fui ao balcão de novo, e uma constrangida funcionária do caixa disse que não podia discutir o preço cobrado pelos atendentes, que devíamos falar com a “proprietária” da banca, uma senhora que estava cuidando do pernil e nem olhou para o nosso lado.
Enquanto tentávamos ter a atenção da responsável, o garçom, agora visivelmente irritado conosco, tirou do avental seu bloquinho de papel, fez a conta de novo: batatas: “R$ 15 + 10% = R$ 18,00; R$ 4,00 cada latinha e R$3,00 do suco – total: R$ 32,00 .“ Juro, ele fez essa conta na ponta do lápis.
E a gente!--more-->…