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Pesquisa revela 90 espécies de peixes recifais no litoral do PR e SP

Cardume de Salemas nos recifes artificiais | foto: Gabriel Marchi.

Imagine explorar os segredos do fundo do mar, a variedade, as cores e o comportamento dos peixes recifais. A fascinante diversidade de vida subaquática é o foco de uma pesquisa histórica desenvolvida pelos cientistas do Programa de Recuperação da Biodiversidade Marinha (Rebimar), coordenado pela Associação MarBrasil, com patrocínio da Petrobras e do Governo Federal. 

Há 13 anos, os pesquisadores-mergulhadores têm realizado um amplo monitoramento dos peixes no litoral do Paraná e de São Paulo. Os resultados desses estudos, realizados tanto em ambientes naturais, como as ilhas oceânicas, quanto nos recifes artificiais marinhos, confirmaram a existência de cerca de 90 espécies, muitas delas ameaçadas de extinção. 

Ambiente subaquático do Parque Nacional Marinho de Currais | foto: Gabriel Marchi

Os peixes são um dos grupos mais diversos e essenciais do reino animal. Das pequenas marias-da-toca aos imensos meros, cada espécie tem um papel fundamental no equilíbrio ecológico. Além de serem uma fonte vital de alimento para comunidades em todo o mundo, os peixes sustentam importantes atividades econômicas que vão desde a pesca comercial até o turismo de observação marinha.

Os peixes recifais são predominantemente encontrados em fundos rochosos, naturais ou artificiais, com hábitos de vida diretamente associados a esses ambientes, seja para alimentação, abrigo ou reprodução. Geralmente exibem uma ampla variedade de cores e formas, com algumas espécies ocorrendo exclusivamente nesses habitats ou em fases específicas de suas vidas.

Larvas de peixes capturadas em armadilhas luminosas | foto Gabriel Marchi

Censo visual

Os censos visuais por meio de mergulho científico têm sido realizados de forma constante desde 2011 para acompanhar as variações na quantidade e qualidade das espécies. A pesquisa conta com a parceria e a experiência do Projeto Meros do Brasil. Mais recentemente, a partir de 2018, foram iniciados estudos sobre larvas e juvenis de peixes utilizando armadilhas luminosas e redes de plâncton, com foco nas espécies recifais ameaçadas, como o mero, que habitam e frequentam ambientes marinhos, incluindo áreas de transição, como manguezais e recifes naturais e artificiais. 

“Nosso objetivo é monitorar a fauna recifal, espécies ameaçadas e a conectividade entre os ambientes costeiros e marinhos. Pela primeira vez estamos criando uma série histórica com dados científicos das populações de peixes, áreas de agregação e alimentação de espécies ameaçadas, com foco nos Meros, badejos e garoupas”, explica o oceanógrafo André Cattani, coordenador do Programa Rebimar.

A quantidade de espécies varia a cada ano de acordo com as condições da água, temperatura e impactos relacionados à pesca. Cattani observa: “Percebemos, no último levantamento realizado de 2022 a 2023, uma redução nos cardumes de garoupas e badejos. São indicadores que devem ser avaliados com atenção, pois são peixes do topo da cadeia alimentar, responsáveis por manter o equilíbrio da população de outras espécies menores”. 

No entanto, uma boa notícia! As expedições de monitoramento registraram uma presença cada vez mais constante dos meros nas áreas monitoradas, com 158 avistamentos entre 2010 e 2022, sendo 108 deles durante o período reprodutivo da espécie, que ocorre no verão.

Equipamento de mergulho se bolhas e ruídos permite aproximação maior com o mero | foto: Gabriel Marchi.

RAM

Os pesquisadores realizam a contagem na região onde teve início o Programa de Recifes Artificiais Marinhos (RAM), o primeiro projeto da Associação MarBrasil. Em 2004, cerca de duas mil estruturas de concreto foram instaladas entre o Arquipélago de Currais (agora Parque Nacional Marinho) e as Ilhas Itacolomis, formando o conhecido ponto “Parque dos Meros”. Além disso, mais duas balsas graneleiras, a Dianka e a Espera 7, foram afundadas para esse fim longe da costa. Em 2012, já com o Rebimar, a Associação MarBrasil instalou mais 5.500 estruturas de concreto para a manutenção e recuperação da biodiversidade marinha, paralelamente à costa de Pontal do Paraná, sendo este o primeiro projeto de recifes artificiais do Brasil com licença do Ibama.

Além das áreas mencionadas, os censos aquáticos também se estendem pelos ambientes recifais das Ilhas de Castilho e Figueira, no litoral de São Paulo. O acompanhamento confirma que a presença dessas estruturas ampliou as áreas de reprodução dos Meros na região.

“Atualmente, a espécie está classificada como criticamente em perigo no Brasil e vulnerável à extinção no mundo. Quando o monitoramento começou, era muito raro avistar um mero na costa paranaense. Era um peixe que já estava praticamente em processo de extinção, não só no Paraná, mas em escala global”, afirma o coordenador do Rebimar.

Ele acrescenta: “Partimos do pressuposto de que a manutenção do status populacional do Mero e de diversas outras espécies nos ambientes recifais é um indicador de boa qualidade ambiental dessas áreas. Esta ação será continuada nos próximos quatro anos, em duas metodologias distintas, visando complementar informações sobre ocorrência, abundância e aspectos comportamentais da espécie”.

As duas metodologias utilizadas pelo Rebimar são complementares e fundamentais para um monitoramento mais preciso da biodiversidade marinha. A primeira tem como base a observação das espécies adultas por pesquisadores-mergulhadores. Os censos visuais e filmagens subaquáticas são realizados com o uso do rebreather, equipamento de mergulho que não produz bolhas e não gera ruídos, permitindo um maior tempo para a observação de espécies e seus comportamentos naturais. Com ele, os mergulhadores permanecem no fundo do mar por períodos de 60 minutos, em profundidades de até 30 metros. 

Rebimar

A segunda metodologia é mais recente, começou a ser usada pelo Rebimar em 2016, e baseia-se na instalação temporária de um equipamento que registra imagens, sem a presença do mergulhador. O BRUV (Stereo Baited Remote Underwater Video) permite identificar remotamente e quantificar espécies de peixes ocorrentes na área e avaliar como elas interagem com os meros. 

Ao longo das amostragens, foram avistados 29.800 peixes, distribuídos em cerca de 90 espécies. Nos recifes naturais, foram observados 14.645 peixes, e nos recifes artificiais, 15.155 peixes. Em geral, os dados indicam uma estabilidade na população de peixes recifais nos ambientes rochosos naturais e artificiais ao longo do tempo. Entre os registros do censo, estão peixes classificados como “vulneráveis à extinção” como o peixe-porco, o mero, a garoupa-verdadeira, o cherne, o badejo de areia e a caranha. 

Peixe-frade é avistado tanto em recifes quanto em fundos rochosos | foto: Gabriel Marchi

Algumas espécies ocorreram exclusivamente nos recifes naturais como o ariacó, a raia-chita e o Peixe-papagaio-cinza. Já o cherne, o badejo-de-areia e o ariacó só foram vistos nos recifes artificiais, assim como a sardinha-verdadeira, espécie que apesar de não ser recifal foi registrada em cardumes nos censos visuais. 

Além do levantamento inédito das espécies de peixes recifais, este estudo tem proporcionado registros fascinantes das paisagens submersas. As comunidades de seres marinhos que habitam os recifes naturais e artificiais são deslumbrantes, revelando a exuberância e diversidade dos ecossistemas marinhos do litoral. As imagens não apenas enriquecem o entendimento sobre a vida marinha, mas também reforçam a importância da conservação desses ambientes preciosos. 

Pesquisador-mergulhador em expedição de censo visual de peixes | foto: Gabriel Marchi

O Programa

O Programa Rebimar é um conjunto de ações socioambientais voltadas para a conservação da região litorânea, principalmente no Paraná e na costa sul de São Paulo. A iniciativa faz parte da Associação MarBrasil, tem patrocínio da Petrobras e conta com apoio científico do Centro de Estudos do Mar da Universidade Federal do Paraná e do Instituto Federal do Paraná.

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