Ação do MPF e MPPR pede anulação de licença para o porto de Pontal do Paraná
MPF e MPPR apontam ausência de consulta livre, prévia e informada das comunidades tradicionais e indígenas afetadas
O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Paraná (MPPR) ajuizaram ação civil pública para anular a licença prévia de instalação do porto de Pontal do Paraná, denominado Maralto Terminal de Contêineres.
Segundo a ação, as comunidades originárias e tradicionais afetadas não foram consideradas no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e ouvidas por meio de consulta livre, prévia e informada, como exigem normas constitucionais e internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A empresa diz que “todas as exigências legais foram rigorosamente atendidas e, mesmo diante de demandas judiciais, não há impedimentos para a implantação do projeto” – leia nota no final.
A ação, com pedido de liminar, foi ajuizada contra a Maralto Terminal de Contêineres S.A., o Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas). Além da anulação da licença prévia de instalação e operação do empreendimento, o MPF e o MPPR pedem a proibição de expedição de nova licença de instalação ou operação do terminal portuário até o julgamento da ação. Dessa forma, a fim de sanar os vícios apontados, os ministérios públicos pedem que a Funai seja condenada a exigir a realização de consulta às comunidades indígenas e a elaboração de novo Estudo de Componente Indígena (ECI) do terminal.
Os MPs pedem, ainda, que a Maralto Terminal de Contêineres deve ser condenada a elaborar o Estudo de Impacto Ambiental referente ao terminal, garantindo a consulta às comunidades. Por fim, que o Ibama seja condenado a apresentar à empresa Maralto novo Termo de Referência e a exigir a realização de novo EIA/Rima do Terminal Portuário, após a realização da consulta às comunidades afetadas, bem como a aprovação do novo ECI pela Funai.
Irregularidades – Segundo a ação, o EIA realizado pela Maralto Contêineres não realizou estudo específico sobre nenhuma das comunidades tradicionais que estariam dentro da área de influência do empreendimento – região em um raio de 8 km do local onde está prevista a instalação do porto. A definição dessa área de influência está na Portaria Interministerial nº 60/2015, que trata de procedimentos administrativos que disciplinam a atuação da Funai e Ibama nos processos de licenciamento ambiental, explicam os ministérios públicos.
Com base nesse referencial, laudo técnico elaborado pela Secretaria de Pesquisa e Análise do MPF aponta que o empreendimento intercepta parcialmente os territórios indígenas da Ilha da Cotinga e Sambaqui, bem como 16 comunidades com características de tradicionalidade. “Todas essas comunidades tradicionais e parcialmente tradicionais que estão dentro do raio de 8 km – além de outras mais distantes que pudessem ser direta ou indiretamente afetadas – foram totalmente ignoradas pelo Estudo de Impacto Ambiental da Maralto Contêineres, que não abordou na área de influência direta os impactos que seriam causados nessas comunidades”.
Além disso, a ação destaca que tanto a elaboração do EIA/Rima como a expedição das licenças prévias e de instalação ocorreram antes mesmo da apresentação do ECI à Funai, “o que deixa claro o desinteresse e a despreocupação da Maralto Contêineres com os indígenas que sofrem o impacto do empreendimento portuário”.
Ainda segundo o MPF e o MPPR, “apesar dos vícios na elaboração do EIA e da falta de participação da população interessada durante o processo de licenciamento”, o Ibama expediu licença prévia ao empreendimento em novembro de 2010, com validade de 2 anos, renovada por mais 2 anos em março de 2013.
Em seguida, mesmo com o ajuizamento de ações populares contra a licença prévia emitida pelo Ibama, o órgão ambiental expediu licença de instalação ao terminal portuário da atual Maralto Contêineres, em maio de 2015. No entanto, os efeitos dessa licença ficaram suspensos entre 2015 e 2018 por força de decisão em uma das ações populares ajuizadas contra as licenças concedidas ao empreendimento.
Os ministérios públicos também apontam que o ECI do Porto foi apresentado à Funai apenas em dezembro de 2016, mais de um ano após a expedição da Licença de Instalação, em maio de 2015. De acordo com a ação, tal estudo foi realizado às pressas e de forma conjunta pelo terminal portuário e pelo empreendimento da “Faixa de Infraestrutura” – estabelecido pela licença prévia aprovada em 2010 – como se fossem um só, “o que dificultou a compreensão da população afetada a respeitos dos impactos de cada empreendimento”.
“Nós visitamos as comunidades indígenas e as questionamos sobre a realização do Estudo de Componente Indígena que abarcou, de uma vez só, dois empreendimentos extremamente complexos. A confusão entre os indígenas foi evidente, isto é, eles não souberam, nas reuniões que pautaram o estudo, quando se falava de um ou outro empreendimento”, destacou a procuradora da República Monique Cheker.
A ação destaca que um dos principais problemas que faz com que o Ibama não considere as comunidades afetadas é a omissão existente na Instrução Normativa nº 184, de 2008. Ela é silente e inadequada à Convenção 169 da OIT. Assim, há o pedido também da declaração incidental de sua inconvencionalidade, com efeitos nacionais.
Nova licença – Após o término da validade da licença de instalação concedida em 2015, o Ibama iniciou as diligências para expedição de nova licença de instalação do Terminal Portuário Maralto. Mesmo após recomendação conjunta do MPF e do MPPR para tentar impedir a expedição da autorização, o Ibama concedeu a Licença de Instalação 1482/2023, publicada em janeiro de 2024. Nova recomendação conjunta dos Ministérios Públicos foi enviada ao Ibama, que não acatou o pedido para anulação da licença concedida ao empreendimento.
Além disso, a ação cita que, em 19 de junho, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a nulidade do EIA/Rima e da Licença Prévia da “Faixa de Infraestrutura de Pontal do Paraná”. Segundo o Ibama, tal licença é uma das condicionantes para a instalação e operação do Terminal Maralto de Contêineres.
Diante dessa decisão, o MPF e o MPPR entendem que, por consequência, a Licença de Instalação 1482/2023 também deve ser reconhecida como nula, tendo em vista que foi concedida com base em documentos com nulidades.
Nota da empresa Maralto
“O Maralto Terminal de Contêineres informa que sempre cumpriu todas as exigências legais na obtenção de suas licenças. O processo de licenciamento passou por todas as etapas de Licença Prévia até alcançar a Licença de Instalação. Todas as exigências legais foram rigorosamente atendidas e, mesmo diante de demandas judiciais, não há impedimentos para a implantação do projeto.
“Ressaltamos que o projeto tem potencial de gerar mais de 1.500 empregos diretos e cerca de 5.000 empregos indiretos, em uma região que atualmente depende exclusivamente do turismo e enfrenta problemas como acessos precários, enchentes e falta de perspectivas de crescimento de renda.”